Sem perder o foco de minha disciplina, que é as Artes Visuais/Artes Plásticas, trabalhamos este tema multidisciplinar, em que precisamos tomar conhecimento não apenas dos elementos básicos da linguagem visual (cor, forma, composição, espaço etc.; gêneros de pintura: retrato etc.), mas também nos adentrarmos em temas que dizem respeito a outras áreas do conhecimento: no caso, a História do Brasil.
Este ano, 2011, na linguagem das Artes Visuais, dei relevo às artes urbanas e ambientais. De início, pensei em trabalhar o "lambe-lambe", que é uma arte de rua com a técnica de colar cartazes nas paredes. Os alunos pesquisaram sobre várias modalidades de arte urbana e assistimos a vários vídeos interessantes sobre lambe-lambe, stickers, estencil etc.).
De acordo com a proposta do Conexão das Artes SME-RJ, fiz o workshop para professores da rede com o artista Antônio Bokel, sobre intervenção urbana, em que finalizamos com uma intervenção lambe-lambe numa parede em frente ao Calouste Kulbenkian (local onde aconteceu o curso). Eu conversei com meus alunos como havia sido esta experiência no workshop do Bokel. Eu pretendia que meus alunos não ficassem só na teoria ou só na visualidade "distante" dos vídeos, eu queria propor a eles uma intervenção com esta técnica.
Porém, por "questões técnicas", digamos assim, a proposta precisou ser adiada. A proposta era intervir num muro interno da escola com reproduções (fotocopiadas) do retrato de João Cândido, onde os alunos criariam outras interferências a partir da montagem. Com as cópias em mãos, mas (ainda) sem o restante do material, lancei a proposta deles intervirem (individualmente), com o material que eles tivessem em mãos (canetinhas, lápis de cor, tinta guache, giz de cera...), na imagem fotocopiada (na proposta anterior, seria uma interferência coletiva direta nas imagens fixadas no muro pela técnica do lambe-lambe).
A ideia de trabalharmos o gênero artístico retrato é que alunos de algumas de minhas turmas tiveram a oportunidade de visitar a exposição "Zerois: Ziraldo na tela grande" e "Anita Malfatti: 120 anos" no CCBB-RJ. Eu pretendia tê-los levado também para verem a exposição "Parede" no CCJF (mas não conseguimos o transporte). De posse do o material do setor educativo, eu repassei o conteúdo das exposições para os alunos/turmas que não puderam ir (disponibilizaram só dois ônibus e eram seis turmas de uma média de 40 alunos por turma). O rico material do setor educativo do CCBB sobre a exposição de Anita enfocava o "retrato". A exposição de Ziraldo mostrava os heróis das HQs e desenhos animados em situações cotidianas (num asilo de idosos, assistindo TV, num encontro amoroso etc.). Eram, em sua maior parte, "apropriações" de obras artísticas/históricas.
Levei para minhas turmas a questão: "que relação podemos ver entre os retratos da exposição de Malfatti e os heróis da exposição de Ziraldo com o retrato de João Cândido, líder da Revolta da Chibata (no qual vocês agora estão criando interferências artísticas)"? Não foi difícil a correlação: tal como Anita Malfatti, os alunos puderam (re)criar retratos de um herói de nossa história brasileira e carioca, um herói de carne e osso, que viveu situações cotidianas, tal como os super-heróis das grandes telas de Ziraldo (uma das revindicações da "Revolta" era bem "cotidiana", reivindicava-se melhores condições de trabalho e de alimentação, além, claro, do fim dos castigos físicos, pela qual a revolta dos marinheiros de 1910 ficou conhecida como a Revolta da Chibata).
Escolhemos apresentar os trabalhos através da linguagem do vídeo e do retrato fotográfico. A interferência no retrato fotocopiado de João Cândido foi trabalho de sala de aula para todos os alunos de minhas turmas (mas só escolhemos alguns para escanear - havia quase 300 trabalhos!); já a fotografia (o retrato dos alunos da escola) foi opcional, participava quem quisesse, inclusive alunos de uma das turmas em que eu não lecionava na época quiseram ser fotografados (vários alunos desta turma, 1604, antiga 5ª série, participaram este ano, 2011, voluntariamente em algumas de minhas propostas nas aulas de Artes, como, p.ex., "Os Guardiões da Escola Mario Piragibe: ativismo pela preservação do meio ambiente escolar").
Os alunos assistiram a vários vídeos sobre o episódio histórico da Revolta da Chibata, tanto voluntariamente, através de pesquisas individuais no Youtube, como obrigatoriamente, durante as aulas (para isso, contei com a estimável colaboração dos colegas professores de História: Talita Oliveira e Rafael Rossi). Os alunos fizeram ainda pesquisas (na Internet, na Sala de Leitura da escola etc.).
Montamos o vídeo com a música de João Bosco e Aldir Blanc, O Mestre Sala dos Mares (em que os alunos - em sala de aula, a partir de um vídeo que uma aluna conseguiu no YouTube -, confrontaram as duas versões da letra: a atual e a proibida pela censura militar da época), e finalizamos com os dizeres da placa comemorativa que acompanha o monumento do Marinheiro João Cândido na Praça XV, Rio de janeiro, inaugurada em 2008 (quando de sua anistia): agora, há bem mais do que somente "as pedras pisadas do cais"!
Profa. Talita, de História, e nossos alunos, no CCBB-RJ
VÍDEOS ASSISTIDOS EM AULA
Diversos curtas do Youtube sobre o tema (1) e ainda outros, como, por exemplo, "Memórias da Chibata", ficção, de Marcos Marins, e "João Cândido e a Revolta da Chibata", documentário, de Produção da Turma Balacobaco (2004) da Escola de Audiovisual Nós do Cinema.
NOTA:
(1) Ver ainda os outros posts de nosso trabalho neste tema: